25 junho 2006

Os pais quase nunca se preocupam com o que os filhos "são". Os pais se preocupam com o quê os outros pensam que os seus filhos se tornarão.
Por isso, prefiro criar cães e gatos.

23 junho 2006

Tenzin Chopell


Há um tempinho atrás li uma crônica do Tenzin Chopell, péssima por sinal, onde ele falava do casamento e de como ele – o casamento – tem fortes tendências a se tornar uma instituição falida. Fui obrigada a lembrar das palavras dele ontem, ao ser interrogada por um amigo do porquê não havia me casado quando fiquei noiva, há dois anos atrás.
Chopell me veio à cabeça porque, na hora de fugir do altar, pensei no casamento como um negócio, um empreendimento entre duas pessoas. E como nós formávamos um casal de arruinados, nossa empresa convictamente não iria lá ser um prêmio de merchandising.
É claro que todos os casamentos não podem ser baseados nesta opinião de esgotamento conjugal. Alguns casais, como meus pais, formam pares delirantes, são pau-pra-toda-obra e sentem um vazio imenso quando têm que dormir separados. Se amam e se odeiam, mas acima de tudo se amam. Mas ali, no meu caso, seria sexo, contas em conjunto e sexo e sexo de novo
. Não que sexo seja ruim, mas um amor de vez em quando cai bem. E ele também não curtia Led.
E falando em amor, hoje ouvi da Janis Joplin “don´t you want somebody to love, don´t you need somebody to love. You better found somebody to love” e ali me deparei com uma intrigante idéia. Acho que ela falava comigo. Tenho certeza de que ela falava comigo. Talvez isso não resolva todos meus problemas, que cá entre nós são um frenesi em esmorecimento. Mas quem sabe, seguindo os conselhos da pirada Janis, eu não mudo essa opinião sorumbática sobre a vida a dois e tente, daqui a uns bons e sórdidos longos anos de solidão, arranjar um belo par de olhos míopes pra me chamar de "benhê".

22 junho 2006

Beatriz

Dei-me o enorme prazer de ouvir, por primorosos quatro minutos e 59 segundos, “Beatriz”, na voz de Milton Nascimento.
Na visualização alquimia aleatória, do Media Player, assisti algumas linhas em azul-celeste, rodopiando como uma bailarina no céu, na mesma disposição que eu imagino Beatriz não andando "com os pés no chão".
E aos três minutos e 23 segundos, me aparece um desenho que... “será que é uma estrela?”.
Foi quando, pela segunda vez, ouvi “e se eu pudesse entrar na sua vida” e uma lágrima viajou dos meus olhos, correu nos mais longínquos pensamentos, ascendeu até o “sétimo céu” e emperrou, nas “paredes feitas de giz”. No mesmo instante, o Brasil fazia seu segundo gol no terceiro jogo da Copa.

Por um momento, senti vontade de ser a Beatriz do Chico Buarque. Ao menos para dizer-lhe “quantos desastres” têm na sua mão. Será que seria "perigoso a gente ser feliz?" Ou seria "o contrário"?


http://elefectob.castpost.com/428644.html

21 junho 2006

Malditos portugueses!


Maldita hora em que os portugueses colonizaram o Brasil.

19 junho 2006

O que uma janela não faz...



Ontem, enquanto tentava dormir, ouvi um casal discutindo na rua.
Ela chorava, e ele repetia calmo, ponderado: “Acabou! Acabou! ... Acabou!”.
Espiei pela fresta da cortina. Eram três horas da manhã. Com os faróis acesos, o carro estava no meio da rua.
Enquanto ela ia caminhando em direção a lugar nenhum, ele abriu a tampa traseira da camioneta e tirou de lá uma mochila. “Tuas coisas eu vou deixar aqui”, ele disse com uma intensa brandura e dispensou cuidadosamente os pertences na calçada, há mais ou menos quatro ou cinco metros de distância dela.
Ele entrou no carro e disse, ainda tranqüilo, “agora te vira”.
Estiquei a cabeça pra fora tentando escutar a resposta dela. No abrir a janela, um berro da fricção.
Ele abriu a porta do carro novamente, tirou metade do corpo pra fora e, olhando na minha direção gritou: “Vai cuidar da tua vida!”.
Ela saiu de trás do muro, encolhida como um bodoque desarmado e apareceu com os braços cruzados querendo ver com quem ele falava. Ele pediu para que ela entrasse no carro e foram embora.

Se ficaram juntos, não sei. Mas há possibilidades.

14 junho 2006



Me perguntaram o que eu queria de presente no dia dos namorados.
Respondi que minha parte eu prefiro em poesia.

10 junho 2006

Esteira rolante

Abri a porta e saí rumo à calçada. Caminhei até uma amiga, que mora na mesma quadra, para lhe emprestar um livro que me pedira há semanas. Encontrei o portão trancado decidi continuar a andar. Daria a volta no quarteirão e regressaria para casa.
Mas era início de Copa, a televisão transmitia Suécia e Trinidad Tobago, eu acabara de terminar um namoro onde já não havia nenhuma perspectiva, estava sem companhia e por fim, não tinha uma ponta de vontade de ficar em casa.
Segui por mais duas quadras. Eu só pensava ‘nele’ e os caminhos que eu fazia eram em direção a sua casa. Não desgrudava do telefone. Até pro banheiro eu levava o celular. A cada 60” olhava no menu de “chamadas não atendidas”.
Já em frente ao mercado e pensando se entrava ou não entrava, entrei. Fiquei observando as pessoas subirem na esteira rolante sendo levadas para as compras. Pedi 500ml de água de côco e quando cheguei na metade do copo não agüentava mais beber. Aquela fora a refeição mais saudável que eu tivera nas últimas duas semanas. Quase todos os dias me alimentava de uísque, cigarro e morangos. E pensava ‘nele’.
Vi uma mulher magra como uma formiga de regime usando óculos escuros subir a esteira e me diverti terrivelmente com aquilo. Me lembro bem de ter soltado uma gargalhada e o rapaz do quiosque ao lado ficar olhando incompreensível pra mim. Com uma visão privilegiada dos demais, a via caminhando brusca e desengonçada como um andróide demente. Aquelas pernas retas e sem contorno daquele corpo esgalgado me proporcionaram um ataque delicioso de riso e aquilo me inspirou intimamente.
Terminei minha água de côco, que agora pesava no meu estômago, e subi ao mercado. Decidira que iria registrar aquilo prontamente. Eu precisava de uma caneta.
Estava tudo planejado na minha mente: Iria comprar a caneta e me sentar na escada que dá vista pra esteira e descreveria no verso do livro tudo o que parecesse apropriado.
Disparei num ritmo empolgante, como quem está para perder o trem das onze para Jaçanã onde mora a noiva que não se vê a três meses. Fui direto para a seção de material escolar. Hoje penso que aquela seção deveria ser denominada “materiais para elaboração de textos inúteis, imprevisíveis e traumatizantes.”
Escolhi a mais execrável e ordinária das canetas. Eu queria me convencer de que era quase tão boa quanto Nelson Rodrigues, mesmo com uma caneta medíocre.
Lembrei-me naquele momento que eu precisava de um xampu, coisa que antigamente era artigo de luxo e hoje é uma extraordinária – ou seria ordinária - necessidade. Eu que sempre abominei mulheres neuróticas com a beleza, comprei o mais caro. Decidi mudar meu estilo quanto aos cuidados estéticos. Talvez fosse ‘ele’ que me motivasse a melhorar.
Indo para o caixa, passei na seção de queijos. Rasdaam. Um queijo uruguaio levemente adocicado que me tentava profundamente a devorá-lo ali mesmo, como um tigre faminto. Como uma digna mineira, não poderia decepcionar o meu desejo e abanquei aquele triângulo que me fazia rememorar os moldes da bandeira da minha terra. Mas enfim, eu ia abocanhar o queijo pensando ‘nele’.
Aproveitei e apanhei um esmalte cor-de-rosa na estante de cosméticos. Eu não era acostumada a pintar as unhas, mas como decidira mudar, seria então radicalmente – ao meu ver.
Passava as compras no caixa e ansiava para escrever. 10,74. Depois da água de côco, me restara 12 reais no bolso e agora me sobrava 1,26 para passar todo aquele final de semana que tinha tudo para ser longo e melancólico. Meus planos de ir ao cinema mais tarde foram por água abaixo.
Mas ergui a cabeça, agradecia atendente que tinha o rosto cheio de espinhas e uma ferida no canto esquerdo do lábio. Me senti bem por ver ela daquele jeito – afinal, haviam pessoas mais feias do que eu - e desci pela mesma esteira que mais tarde ‘ele’ passaria.
Sentei-me na escada e encostei as duas sacolas nos pés. Prostrei-me para a multidão que me ignorava completamente.
Desembrulhei a caneta e abri as páginas do livro copiado em folhas de sulfite. Olhava atentamente esperando alguém que me inspirasse novamente, depois da pequena andróide demente.
Vi uma senhora que tentava subir pela esteira com uma cadeira de rodas automática do mercado e pedia para a filha lhe tirar uma foto. Abri o queijo e dei uma generosa abocanhada nele.
‘O’ vi despontando do alto da esteira. Parecia suado e feliz. Mais atrás alguém lhe batia nos ombros: “Segure pra mim” eu li nos lábios dela enquanto ‘lhe’ passava algumas sacolas. Prendeu os cabelos com um elástico tirado de meia-calça, deu-‘lhe’ um beijo na boca e pegou as sacolas de volta.
‘Ele’ e ela. Eu e a minha caneta vagabunda. Provavelmente pálida, me levantei para regressar a casa. No caminho, parei de frente prum latão de lixo, ergui as duas sacolas em cima dele e observei-as por exatos cinco segundos e as lancei como quem lança um peixe vivo de volta ao mar. No bar em frente, comprei uma garrafa de vinho.

09 junho 2006

Digo a ele que fico



Seu rosto enrubescido da bebida e pálido da carência de sol jazia sob um reflexo da lâmpada que lhe iluminava os olhos.
Ah, aqueles olhos. Eles me diziam tanto e ao mesmo tempo uma ninharia de vocábulos presumíveis, que nunca foram pronunciados.
Às vezes, quando trocávamos uma palavra, percebíamos tudo. Uma só palavra.
Recordo-me uma vez de ter dito “talvez”, após uma olhadela. E lá fomos nós pruma mesa de bar.
Suas dúvidas eram como as minhas. Só um disfarce para atingirmos o desfiladeiro daquela conversa estapafúrdia e saborosa.
Seus lábios convocavam os meus, mas não me tocavam.
Suas mãos abrasadoras me afagavam por um segundo num falso esbarrar, mas não me prendiam.
Tenho que aceitar que esses lapsos de ansiedade e conversas de botequim me convenceram a tomar sérias e deliciosas decisões.
A barba por fazer me fez pensar que ele estava só. Pura utopia.
O que realmente me segurava a ele eram suas palavras. Sinceras, grotescas e às vezes bucólicas. Mas sinceras.
Cada olhada era uma lufada de benevolência. Era como se os seus braços me envolvessem para me resguardar da aura de inverno. Aqueles olhares sustentavam meu ego, meu arcabouço, minha consternação, minha cisterna de ilusões.
Minhas pernas deslizavam sobre as suas indiscretamente como se quisessem se entrelaçar. Um minuto sem senti-lo e a guerra contra meu bel-prazer se iniciava. Era um desalento pros meus restos mortais.
Minha barriga borbulhava de agonia. Aquelas vozes murmurando ao nosso redor e eu só sentindo o seu calor, o seu tremor, o seu cobiçar. E nada fazia.
Foi aí que o beijei. Senti-o como meu.
Joguei-me contra seu corpo e nos imaginei inventando um púbere amor. Estremecia a cada peça de roupa que caía e sentia aquelas mãos quentes se arrastando pelas leves curvas da minha nuca e se agarrando nas minhas coxas.
Seus olhos cerravam e abriam. Pediam por mim. Queriam-me, fingiam me amar, queriam-me e me amavam e fingiam me querer.
Nossos corpos se emaranhavam e compunham um eco de um grito de socorro, pedindo por mais. Arrancar-lhe as roupas não me era suficiente. Queria despir nossas peles, desenfrear nossas almas, desmiuçar nossos segredos ali mesmo
, naquele chão trepido com nosso ardor.
Acordei. Na cabeceira da cama, duas taças vazias.

Texto publicado no suplemento PALAVRA VIVA - edição 2006.

04 junho 2006

My advice to all young writers is quite simple. I would caution them never evade a new experience. I would urge them to live life in the raw, to grapple with it bravely to attack it with naked fists.

A. Bandini

01 junho 2006

Meu próprio eu



Gosto-te tanto que enxergo teusolhos quando me vejo no espelho e escuto tua voz, num eco de meus gritos silenciosos chamando teu nome.
Quando tenho saudade, sinto o gosto amargo dadistância do teu natural perfume, que diariamente tenta me viciar.
Você vem e me pede: “Quinze dias sem me ver.”
Impotente, vou mais uma vez tentar ficar sem você;o complemento de meu próprio eu.
Acato a decisão. Porém, deixo claro que, no escuro, sofre o meu íntimo.
Ainda que te espere com paixão.
Deve ser esta a tal dança da solidão. Se for para dançar, quero sentir o chão gelado penetrando nos meus pés descalços, a brisa fraca deslizando em minha frente e a dor dos meus braços tentando abraçar a lembrança do teu corpo e esquecer, com outro desgosto, a dor de não ter você.
Texto publicado no suplemento PALAVRA VIVA - edição 2006.