24 agosto 2010

TEMPLO DO INFORTÚNIO

Reproduzo a inscrição na camiseta do Encontro dos Blogueiros Cansados: CANSEI.
Tô em casa sentada num sofá com mais idade que eu assistindo Bill Murray, comendo pão amanhecido com refrigerante sem gás e pensando: Será que é isso estar “jogada às traças”? (Mesmo que eu não veja as traças e mesmo que seja o Bill Murray?)

O ano começou e eu pensava diferente: “Esse é o meu ano”.
Talvez o egoísmo e a pretensão de ter um ano só pra mim tenha me consumido pouco a pouco. E próximo ao fim de setembro quase chego a conclusão de que – definitivamente – o ano não é meu. QUASE. Porque a esperança... você já sabe.
E olha só como foi o início. Meu namorado me pediu em casamento, eu ganhei um aumento de salário no trabalho, mais tarde fui chamada a trabalhar em outra empresa melhor, ganhei um carro novo da mamãe. Tava indo tudo bem até que: “toc toc toc”.
- Quem bate?
- É a DESGRAÇA!
E você acha que eu abri a porta para ELA? (Acho que até merece nome próprio nesta altura.) Claro que não. “EU SOU MAIS ESPERTA QUE VOCÊ”, pensei.
Ledo engano.

Uma hora eu precisava sair. E no oitavo andar de um edifício é um tanto complicado retirar-se por algum lugar que não seja a porta.
E foi aí que Ela chegou. Sorrateira, esperou dois dias inteiros no cantinho do hall de entrada. Onde a visão do olho mágico da porta não alcançava.
Traiçoeira. Apareceu e grudou como quem recebe o tapa de uma ex-dama. Sim, ex, pois dama que se preze jamais desferiria um tapa tão cruel. (Desferiria?) Só em filmes o golpe parece tão elegante.

Ela ia e vinha comigo. Por todos os lados estava Ela prestes a me ferir.
Pra começar me demitiram. Sem justa causa e sem explicar o motivo – que é pra mostrar que a DESGRAÇA não é pequena. Mais tarde, subitamente, bateram no meu carro ESTACIONADO. E fugiram... sem deixarem ao menos o número do seguro. A empresa em que meu namorado trabalhava faliu. E sem forma de planejar o futuro o casamento acabou adiado.
Passei sabão, detergente, água sanitária, creolina, álcool. Taquei fogo. Nada destruía a humilhante desgraça.

Foi aí desconfiei de olho gordo de um ex-namorado. Quando se deu o anúncio do noivado e a notícia se espalhou – e em meio jornalístico ela se espalha rápido, acredite! – o ex resolveu aparecer. Fez birra, chorou e contou todas aquelas balelas que a dor de cotovelo faz a gente dizer. Ousou prometer que eu não seria feliz e que faria de tudo pra eu mudar de idéia. Até pintou o cabelo pra tentar me convencer que era jovem o suficiente pra mim. E era por isso que não dava mais certo. Mal compreendia ele que eu gostava justamente da originalidade.
Mas subestimei este jovem senhor ensandecido. Não pensei que a urucubaca fosse tão forte. O homem freqüenta os melhores terreiros da cidade. Mantém um pequeno galinheiro no fundo do quintal. Mandou presentes incógnitos do Peru, Colômbia e mais tarde, São Tomé e Príncipe. Deixava na portaria e corria. Lotou minha caixa de emails a ponto de travar tudo. Sempre dizendo que não aceitava ficar sem mim.

Decidi que era o momento de procurar ajuda espiritual. Fui pra Igreja. Levei o noivo junto. Repetíamos como um mantra: “Sai uruca. Sai uruca. Sai uruca”.
Continuamos desempregados. Fui obrigada a vender o carro. E o casamento?
Bem, a data está marcada mas... como será?
Como nossa visitação ao templo divino tornou-se assídua decidimo-nos guiar pela fé.
Deixamos tudo definido e como quem torce pelo time em final de campeonato - apostamos num milagre. Se ele chegar logo ficamos bem.
Do contrário, estaremos em alguns meses olhando um para a cara do outro se perguntando “quem vai vender o corpinho desta vez?”

24 de agosto de 2010. Terça-feira. 14:10.
Espero aqui, à frente do computador – enquanto a energia e a internet não são cortadas – um milagre. Ou a morte chegar, para os mais dramáticos.
Talvez eu funde uma Igreja Virtual. Por enquanto me domina o Templo do infortúnio (vulgo desgraça).
Ela ainda está aí. Agarrada a mim como um carrapato faminto. Querendo procriar. Se estendendo aos mais próximos.
Te aconselho a ficar longe de mim. Exceto se você tiver chance de ser minha salvação.
Ah, uruca. Sai! Vai pra bem longe daqui.
Quem sabe ainda há chance deste ser o NOSSO ano.